sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Bagagem extra

Sentado no divã, desabafou ao longo de 2 semanas, em quatro sessões de 50 minutos, uma série de questões desconexas. Precisava dizer quem era e como tinha se perdido.
Os problemas diários não o atormentavam mais do que de costume. Ele queria dizer que seus momentos mais felizes foram frutos de opções insensatas. E que tinha medo de ter desistido do incerto. Em alguma curva do caminho parecia melhor esperar o tempo passar. Estava cansado. Nada além disso.
Não contou nada de novo, nada que não soubesse de cor. Como a repetição de fatos ancestrais o ajudaria a encontrar-se?
Não era o que dizia. Havia um peso invisível. Um peso em formato de gente. E o peso o expulsara de si.
Resolveu sair um pouco do casulo. Mas não eram justamente essas escapadas que o levaram ao divã?
Por um momento sentiu que não tinha mais o que dizer. Precisava viver. A análise lhe parecia muito com a escrita. Escrever era um pouco como afogar-se. Você congela o tempo e esse poder lhe faz perguntas em silêncio. Se escrever e analisar-se eram a pausa da vida, como conciliá-los todos?
Ainda haveria algum espaço para a expontaneidade lá fora? Sentia-se ridículo. Então ser adulto era isso....Arrastar correntes, tomar remédios, lamber as feridas.
Terça-feira, meia-noite. Uma vez mais resolveu entregar-se ao ritual profano. Jurou que chegaria sóbrio, ao menos.
Entrou. E ainda sóbrio, sentiu uma sensação verdadeira. Não era fuga. Ele queria estar ali. De alguma forma aquilo ainda fazia parte dele. Não era mais o mesmo e sabia disso. Sabia disso.
Pediu uma garrafa de champagne. Tentaria confiar nas bolhas douradas uma vez mais, embora mesmo elas já o tivessem traído.
Ele não estava ali à toa. Repetia o ritual que passara a temer, mas estava um pouco mais leve. E fazia toda a diferença. Expontaneidade era confiança. O ritual era o mesmo, os participantes eram os mesmos, o coro era o mesmo. Mas ele tinha escolhido estar ali. E era dono de si. Daquele que não conhecia e que havia entrado em total letargia.
Encontrou os olhos verdes. Apenas sinalizaria o reconhecimento. Eu não te conheço, mas te vejo. SEI que você existe. Mas não se entregaria a jogos.
E quando se falaram casualmente, uma porta se fechou e outra se abriu. A partir dali, voltava a viver a ficção.

5 comentários:

  1. Acho que chega um momento de lucidez na vida, [alguns chamam esse momento de maturidade], no qual as coisas que antes, faziam muito sentido vão se perdendo e, com elas, nós pensamos estar nos perdendo também. No fundo, estamos só crescendo e, sim, isso tudo é muito chato. A parte mais heróica da vida é a fase das loucuras, bebedeiras e desordens, e aquela coisa toda euforica quem vem junto com ela.
    De fato, ser adulto é muito chato... Eu vivo me debatendo nas tentativas de me manter inconsequante e precisar ser responsável... Escolher a ficção é o via que nos resta.

    Abração,

    VidaDeHerdeiro

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  2. E quanto tempo dura/durou a vida na ficção? ;)

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  3. Essa é uma pergunta que só o próprio tempo poderá responder...
    Mas o tempo que durar, tenho certeza de que será especial.

    abs,

    VidaDeHerdeiro

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  4. eu tive que voltar ao primeiro post do teu blog para entender qual é a tua. e me deparei com a sua resposta (nunca a tinha visto) sobre um comentário que deixei lá. isso me fez ficar meio 'dizzy' para comentar esse post.

    volto outro dia.

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  5. Ok, Sandra...Tbm sou entregue aos meus humores...

    abs,

    VidaDeHerdeiro

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