segunda-feira, 27 de abril de 2009

Aliens me visitam pela manhã...

A boca esturricada me lembra de conferir o prejuízo da noite anterior. Só espero ter guardado a porra do recibo do cartão de crédito.
Lentamente ensaio mover a cabeça já em perpétuo estado de rotação sobre o próprio eixo e vislumbro o corpo descoberto de um alienígena nu ressonando placidamente em minha cama.
Será que vale a pena perguntar como veio parar aqui?
Por alguma razão insondável, a visita-surpresa é sempre de alguém mais sóbrio que você.
-Ai minha cabeça...O que aconteceu?
-De que parte se lembra?
-Nenhuma.
-Sério?
-Aham...
-Você perguntou se eu beijava bem e pediu para eu te mostrar...
-Nossa. Queria saber de onde tiro essas cantadas. Mais uma para o meu repertório...Devia anotar.
- Eu até gostei.
- Antes assim, né? Não me leva a mal, vou acabar perguntando tudo de novo...O que você faz mesmo?
- Sou gerente de hotel.
-Ah...E onde mora?
- Nem disso lembra? Moro com minha prima e minha avó no Recreio.
É impressionante minha capacidade de importar seres de todos os cantos da galáxia, por mais perto que saia de casa. Me pergunto se este ao menos tem sua nave-espacial.
- Você sempre bebe tanto assim?
- Dia sim, outro também.
- Que vidão, hein? Não trabalha??
-Não. É uma longa história...
-Tudo bem.

Algumas perguntas adiante, a constatação rotineira. A menos que você se disponha a catequizar o rebento de Krypton, as referências em comum são praticamente inexistentes.

Enquanto boa parte dos homens se pergunta se existe vida em outros planetas, eu tenho plena certeza disso. Aliens me visitam pela manhã.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

A dura vida de um pobre herdeiro

Completei três décadas no início deste ano e NUNCA trabalhei de verdade. Claro que já tive experiências nesse campo, mas nada suficientemente duradouro ou substancial a ponto de garantir meu sustento por qualquer período que fosse. Também nunca fui milionário. Mas como o conceito de riqueza pode ser bastante elástico, vamos a um breve panorama:

1-Não tenho carro e quando estou sóbrio e me vejo obrigado a abrir mão do maravilhoso sistema de trasporte coletivo carioca, acompanho o táximetro atentamente, não por apego ao dinheiro.
2- Não pago aluguel, moro na zona sul, num adorável Apertamento que, reformado, transformou-se num espaço híbrido bastante peculiar. Se conseguir, imagine um misto de sótão/conjugado/quarto-e-sala.
3- Não tenho empregada. Um dos motivos é que a imensidão do meu cafofo me contransge. E, quando morava de aluguel, sentia-me compelido a limpar alguma coisa antes da empregada chegar no afã de dar alguma impressão mínima de higiene pessoal.
4- Nunca tive qualquer aptidão para a cozinha. Resultado: cerca de 90% da minha renda desce pela descarga.

Basicamente é isto. Se um ladrão entrasse aqui em casa, ele daria uma olhada rápida e diria: -Opa, foi mal, ae. Errei de endereço.

Em compensação, se não tenho celulares ou palms de última geração e não frequento academias cinco estrelas, gasto pequenas fortunas em bebida quando saio pela noite.

O que meu extrato bancário tem de limitado, tenho extra em tempo livre, justamente pela ausência da necessidade de trabalhar para garantir meu sustento e alguns pequenos luxos.

Mas está muito enganado quem pensa que é fácil o cotidiano do desocupado. Primeiro porque grande parte das decisões e atividades em que a maioria das pessoas se engaja mecanicamente perdem o sentido. A não ser que você tenha um talento extraordinário para algo e, principalmente, tenha plena consciência dele - o que não é exatamente o meu caso - é preciso encontrar um incentivo adicional para inventar qualquer ofício.

Claro que trabalho e lazer podem ser sinônimos. Mas raramente o trabalho bate à porta de alguém e, se você não tem uma vocação inata para o voluntariado em geral, voltamos à condição anterior, já que nem toda forma de lazer pode ou deve constituir-se em trabalho. Um gênio da computação pode acidentalmente criar um programa que o insira no mercado de trabalho, mas nem todo usuário de computador vai perseguir este fim.

Enquanto busco respostas para dilemas dessa natureza, gasto parte do meu tempo nadando e tentando me convencer de que o ingresso no doutorado em antropologia (visual), se não responde plenamente aos meus anseios, ao menos preenche a recorrente lacuna: O que você faz da vida?

Se você não fosse obrigado a fazer algo para ganhar dinheiro e tivesse todo o tempo do mundo, mas recursos limitados, como você passaria os seus dias?