quarta-feira, 27 de maio de 2009

Já vai começar...

Eu pude ver o exato momento em que envelhecemos. Olhávamos um para os outros cúmplices de algo que havia irremediavelmente ficado para trás. Cada um a sua maneira, nos associamos recentemente ao mesmo clube. Todos desfrutávamos da acidez de seu status. Sentados lado a lado na escuridão solene do teatro, nossos corações não dispararam quando as três campainhas tocaram ou quando a pomposa cortina se abriu. Estávamos prontos para assistir ao que quer que fosse...

Janaína, a negra estridente esculpida em forma de cintura, era agora o retrato da matrona de voz dócil e domesticada. A virgindade que tanto cultivara fôra-lhe arrancada a fórceps. E não em sua aguardada primeira vez, mas numa clínica clandestina numa rua arborizada do Grajaú. Os dias escorriam por entre seus dedos grossos juntos com a água ensaboada da louça. Ela sequer sentia ódio do marido ou piedade por si mesma. Estava satisfeita em acordar um pouquinho mais tarde a cada dia.

Mariana tinha um currículo dos mais invejáveis. Mas ele não continha casamento algum. E a simples pronúncia da palavra lhe parecia mais e mais ridícula com o passar dos anos. Vestira tantas mulheres para ocasiões especiais. Mas não via mais graça em gastar seus figurinos nos finais de semana. As promessas vãs das noites não a seduziam mais. Estava satisfeita em dormir um pouquinho mais cedo a cada dia.

Eu tinha tantos diplomas ocupando espaço nas gavetas que nem sabia o quê responder aos questionários que indagavam: Ocupação? Eu entendia todas as línguas sem tradução, só não tinha mais o que dizer em nenhuma delas. Estava satisfeito em digitar exatamente as mesmas palavras na internet, varando noites e noites a fio.

Mas nada disso realmente importava de fato. Suspiramos, nos demos as mãos. Um novo ato estava prestes a começar...

3 comentários:

  1. existe um devaneio louco nessa postagem, foi um tanto difícil para entender. mas, sou brasileira, e desisto é o c*ralho... e reli de novo. e continuei sem saber se entendi ou não. hehe. então vou lhe contar sobre o que vinha pensando no caminho entre o meu trabalho e o shopping, porque hoje, sendo sexta-feira, final de expediente, senti que precisava espairecer. fui para a Siciliano, peguei um livro qualquer, e sentei-me no sofá. enquanto folheava o livro, me veio o seguinte pensamento:

    'oi, meu nome é Sandra. sou analista de marketing para uma grande multinacional.'

    'oi, sou Sandra. sou estudante de administração em uma universidade federal.'

    'oi, me chamo Sandra. sou a filha mais nova de uma família nem tão grande assim, e que amo muito.'

    somos muitos em um só. muitas responsabilidades, e às vezes poucos feitos. ou, sendo diferente, seríamos capazes de ver o tempo passar... mas eu não vejo.

    suspirei, levantei, e fui embora. minha cabeça estava cheia de mim mesma. precisava era de um bom banho, um chocolate quente, e ler o blog 'vida de herdeiro'.

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  2. um dia a gente percebe que nenhuma vida que a gente venha viver vale a pena... nem a nossa nem se fosse de outro alguém... a gente vai só acumulando coisas ou se livrando delas e nunca está bom, nunca está completo... a gente está sempre começando...
    adoro esses teus textos!

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  3. Adorei a ideia do post-conjunto que, se der certo, pode até virar um blog, o que acha? Continuamos com os blogs pessoais e criamos um pra colocar a demanda dessas nossas inquietações pra fora.
    Enfim, acho que podemos pensar nessa parceria. Sugestões para o tema do post?

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